Breve homenagem ao grande Julio Cortázar
Há trinta e sete anos, num 12 de fevereiro, o grande escritor Julio Cortázar deixava nosso mundo menos mágico e menos inteligente com a sua partida… Abaixo, um de seus muitos textos geniais. É sobre relógios, mas bem poderia ser sobre “smart”phones.
Preâmbulo às instruções para dar corda no relógio
Pense nisto: quando dão a você de presente um relógio estão dando um pequeno inferno enfeitado, uma corrente de rosas, um calabouço de ar.
Não dão somente o relógio, muitas felicidades e esperamos que dure porque é de boa marca, suíço com âncora de rubis; não dão de presente somente esse miúdo quebra-pedras que você atará ao pulso e levará a passear.
Dão a você — eles não sabem, o terrível é que não sabem — dão a você um novo pedaço frágil e precário de você mesmo, algo que lhe pertence mas não é seu corpo, que deve ser atado a seu corpo com sua correia como um bracinho desesperado pendurado a seu pulso.
Dão a necessidade de dar corda todos os dias, a obrigação de dar-lhe corda para que continue sendo um relógio; dão a obsessão de olhar a hora certa nas vitrines das joalherias, na notícia do rádio, no serviço telefônico.
Dão o medo de perdê-lo, de que seja roubado, de que possa cair no chão e se quebrar. Dão sua marca e a certeza de que é uma marca melhor do que as outras, dão o costume de comparar seu relógio aos outros relógios.
Não dão um relógio, o presente é você, é a você que oferecem para o aniversário do relógio.